Tuesday, January 26, 2010

Poème sur le désastre de Lisbonne

O malheureux mortels ! ô terre déplorable !
O de tous les mortels assemblage effroyable !
D'inutiles douleurs éternel entretien !
Philosophes trompés qui criez : " Tout est bien " ;
Accourez, contemplez ces ruines affreuses,
Ces débris, ces lambeaux, ces cendres malheureuses.
Ces femmes, ces enfants l'un sur l'autre entassés,
Sous ces marbres rompus ces membres dispersés :
Cent mille infortunés que la terre dévore,
Qui, sanglants, déchirés, et palpitants encore,
Enterrés sous leurs toits, terminent sans secours
Dans l'horreur des tourments leurs lamentables jours !
Aux cris demi-formés de leurs voix expirantes,
Au spectacle effrayant de leurs cendres fumantes,
Direz-vous : " C'est l'effet des éternelles lois
Qui d'un Dieu libre et bon nécessitent le choix " ?
Direz-vous, en voyant cet amas de victimes :
" Dieu s'est vengé, leur mort est le prix de leurs crimes " ?
Quel crime, quelle faute ont commis ces enfants
Sur le sein maternel écrasés et sanglants ?


- Voltaire

Friday, January 22, 2010

Funeral blues

Stop all the clocks, cut off the telephone,
Prevent the dog from barking with a juicy bone,
Silence the pianos and with muffled drum
Bring out the coffin, let the mourners come.

Let aeroplanes circle moaning overhead
Scribbling on the sky the message He is Dead.
Put crepe bows round the white necks of the public doves,
Let the traffic policemen wear black cotton gloves.

He was my North, my South, my East and West,
My working week and my Sunday rest,
My noon, my midnight, my talk, my song;
I thought that love would last forever: I was wrong.

The stars are not wanted now; put out every one,
Pack up the moon and dismantle the sun,
Pour away the ocean and sweep up the woods;
For nothing now can ever come to any good.


- WH Auden

Wednesday, January 20, 2010

Num espreguiçar do sol

Um sol vermelho olhava o mar,
em meio à bruma da manhã.
Um sol vermelho olhava a terra.

Olhava as coisas, móveis e imóveis.
As gentes e os bichos.
As casas e as janelas, e os bancos da praça.

E na névoa, gentes e bichos e casas e praças
tudo era outra coisa, e tinha outra beleza.
Beleza que só o que não existe consegue ter.

Ali, entre o dia e a noite,
fora de um e da outra

a boniteza das coisas
(as móveis e as imóveis)

...lembrava até a tua.

Tuesday, January 19, 2010

Cores

Cores

Uma bela moça,uma vez
Me deu de comer.
Uma não - duas, três.

Da primeira vez, em verde
Da segunda, em amarelo
E a terceira, roxa -


Uma belíssima gororoba.

Monday, January 18, 2010

Conversa

Meu rosto beija o asfalto
Fica uma marca de batom cinza
Me levanto, lento e confuso
Outro beijo, mais sôfrego
E meu olho não se abre mais,
meus lábios se abrem em sangue.

O olho que ainda abre não vê muito
Mas vejo meus dentes no chão
Vejo as gotas de sangue grosso caindo
Uma a uma, afogando os dentes.
Vejo minha mão, que treme e sua
Com o esforço vão de levantar

É com outros sentidos que tomo nota
Do rasgo na blusa; os fios esgarçados
Ardem quando o vento lhes empurra
Como amantes para dentro da ferida
Aberta, escancarada em meu peito
Sei dela pela dor, que é sentido, pois não?

Com o olfato, sinto os cheiros da rua
Asfalto quente, cocô de cachorro, folhas mortas.
Com a língua, busco os lugares onde havia dentes.
Se saber depois da queda é o bastante -
desisto de levantar,
sento
não penso em nada.

Friday, January 15, 2010

Reflexão

E se fosse apenas
a dor matemática do chicote
sorria
e olhava-te nos olhos
e cuspia-te na cara
só!

E se fosse apenas
a dor física da inércia das lágrimas
bem, ai talvez fingisse
chorar a mulher amada
e cuspia-te somente à cara!

Mas de que nos adianta agora
discutir a matemática e a física?


- Hélder Muteia

Thursday, January 14, 2010

Sorriso final

Sonhei, dormindo (ou talvez acordado)
que haviam conseguido engarrafar teu sorriso
sabidíssimos cientistas, de brancos jalecos
e vetustas barbas, de caretas e óculos
em laboratórios imaculados haviam destilado

Esse sorriso assim, meio tímido
Meio sarcástico
Meio de lado
Quase um riso
Todo sacana

Sorrido na boca, e nos olhos de cílios

i
n
d
e
s
c
r
i
t
i
v
e
l
m
e
n
t
e

l
o
n
g
o
s

E, ao saber disso,
As peruas soterravam de pérolas as atendentes da Daslu
As faveladas saqueavam trens e caminhões
Gangues se formavam, cidades queimavam
E houve choro e ranger de dentes

E você andava pelas ruínas
Rindo até ficar rouca.

Tuesday, January 12, 2010

A mosca na sopa

Aquele foi o ano em que o pessoal da aldeia sacrificou minha mãe ao mar.

Parece um clichê, não? Dos piores. "Aldeia isolada sacrifica pessoas a deuses ctônicos e inumanos." Mas, bem, é verdade. E o que se imagina quando se lê isso - o resto do clichê, está profundamente errado; as pessoas na aldeia em que cresci não tinham olhos esbugalhados de peixe, nem nada contra visitantes. Muito pelo contrário, havia um belo posto turístico ao lado da velha tonarra abandonada, e no cais onde os atuns passavam dos navios modernos para caminhões, o turista podia brincar de restaurateur e oferecer um preço para levar seu próprio atum, que seria limpo, retalhado, e colocado em sacos dentro de caixas de isopor, para que o turista levasse de volta para a cidade grande, onde eventualmente metade do peixe estragaria, depois que o candidato a sushiman enjoasse profundamente até da cor vermelho-viva da carne de atum.

Enfim, não era nada demais. Éramos todos criados aprendendo na escola e na TV aquelas coisas que toda criança japonesa aprende, e em casa que se quiséssemos que a aldeia não fosse punida por alguma calamidade, deveríamos sacrificar, uma vez por ano, algum dos nossos ao deus do mar. Ou aos deuses do mar - as estórias eram meio vagas e muito antigas, então sobre essa parte ninguém tinha muita certeza. Se imaginava que o sr. Ozeki, que era o chefe do culto além de ser o assistente chefe de dez prefeitos diferentes, soubesse, mas como ele era muito mal humorado, ninguém tinha coragem de nunca lhe perguntar nada. (A piada na aldeia era de que uma vez ele teria caído de cama com uma pneumonia, simplesmente porque tinha quebrado a bicicleta numa chuva torrencial e ninguém, ao passar, tinha coragem de lhe oferecer ajuda por medo de levar uma bronca.)

O que sabíamos era que sempre se escolhia na aldeia alguém que estivesse desenganado, e essa pessoa era sacrificada logo antes do solstício de verão, na velha tonarra. Então, quando soubemos que minha mãe estava com câncer, o sr. Ozeki conseguiu convencer os médicos a deixarem ela morrer em casa ao invés de no hospital. Eu tinha treze anos, e ainda não era exatamente um adulto, então me disseram que podia escolher acompanhar ou não a cerimônia, e óbvio que disse sim. Parte porque queria ficar com minha mãe até o fim, e parte porque é bastante excitante para um menino de treze anos ver um sacrifício humano com seus próprios olhos.

Na véspera, minha mãe me deu um beijo na testa e me disse para cuidar bem da minha irmã mais nova. Era como se ela estivesse só indo fazer uma viagem pra cidade, e eu não sabia direito o que fazer, então não fiz nada, além de entregar a ela uma tsurugi, uma cegonha de origami que tinha aprendido a fazer na aula de artes. No dia seguinte, quando acordei, uma tia nos serviu o café da manhã, explicando que minha mãe havia sido levada. Sentar na escola durante aquele dia, tendo que controlar tanto a preocupação com minha mãe quanto a excitação por conta da cerimônia, foi a coisa mais difícil que eu já havia feito.

Naquela noite, fui levado junto com os adultos à velha tonarra. Lá estava o sr. Ozeki, usando uma roupa de pele de atum cujo cheiro eu conseguia sentir, a uns dez passos de distância. Nós outros estávamos todos nus; algumas pessoas tinham grandes olhos amarelos pintados em suas faces. Minha mãe foi levada numa maca para o centro da tonarra; ela estava obviamente drogada, nunca soube se com a própria morfina do hospital ou com algo mais exótico. Tambores batiam, mas eu não conseguia ver quem os tocava (a tonarra tem muitos esconderijos - afinal, os atuns não são burros). Era estranho ver o sr. Ozeki sem terno e gravata, mais do que vê-lo naquela roupa malcheirosa.

A um sinal dele, os tambores aumentaram de ritmo e intensidade. Dois ajudantes se aproximaram de minha mãe com cordas e começaram a atá-la, com muita força. Primeiro nos pulsos. Tornozelos. Joelhos. Cotovelos. Ombros. Coxas. Rapidamente os pedaços separados do coração foram se tornando brancos. Foi atada, então, uma corda em torno da cintura de minha mãe, mais solta, e ela foi descida por essa corda para dentro da água. O sr. Ozeki, então, numa voz estranha, gritou alguma coisa e desceu à tonarra, com uma faca serrilhada na mão - como uma imensa faca de pão. Demorou submerso uma eternidade, e não se podia ver nada debaixo da água escura. Quando emergiu, logo depois içaram minha mãe, e eu podia ver que ela não tinha mais membros - apenas tronco e cabeça, como um Darumá horrível. Os tambores cessaram, e ela foi deixada ali, pendurada, logo acima da água, parecendo mesmo um Darumá na prateleira. Me avisaram que era hora de ir embora.

Mais tarde naquela noite, quando todos já tinham ido dormir, escapei pela janela (minha tia dormia em frente à porta, num colchonete) e fui até a tonarra.

(continua)



N.T. - Tonarra: espécie de labirinto de tanques e canais, para o qual são atraídos cardumes de atuns na pesca tradicional daquele animal. Presos no labirinto, os atuns são arpoados pelos pescadores.

Friday, January 08, 2010

Poema para Akhmatova

Da Tsvietáieva:

Muse of lament, you are the most beautiful of
all muses, a crazy emanation of white night:
and you have sent a black snow storm over all Russia.
We are pierced with the arrows of your cries

so that we shy like horses at the muffled
many times uttered pledge--Ah!--Anna
Akhmatova--the name is a vast sight
and it falls into depths without name

and we wear crowns only through stamping
the same earth as you, with the same sky over us....

I stand head in my hands thinking how
unimportant are the traps we set for one another...