Sunday, January 24, 2016

Saturno

Mais forte é o tempo, que devora seus filhos.
Foram-se as esperanças da mocidez,
Foram-se as lamúrias da velhidão
Da árvore frondosa não restou nem toco.
Mais forte é o tempo, que devora montanhas

Ogro arquitemível, pai do remorso
Bálsamo soberano de todas as dores
Mestre transpotente de fins e começos
Inimigo e irmão do momentâneo e do eterno
Tempo que se ri - do relógio e da hora!

-Tiago Costa de Thuin

Saturday, January 23, 2016

Um poema, de trinta, sobre Fez

Fez amada
Fez traída
Fez esquecida, enviada num cargueiro
Rumo a Veneza
Pra lavar os muros e pavimentar as ruas.

Fez é uma noite de Sherazade
Coim seus palácios deteriorados
Suas vielas infinitas
Com suas pedras
Suas palavras, seus versículos e suas estrelas depostas.

Fez circula no Cairo, a saia fendida, o busto nu.
Fez se instala no mercado de Sana'a
E enxuga as balas da guerra

Fez viaja
e deixa seus ouropéis
Por todo lado quando atacada de asma.


-Tahar ben Jelloun, trad. Cláudia Falluh Balduíno Ferreira



Friday, January 22, 2016

Poema em prosa

This year again there is spring, spring incredibly familiar, so why does poetry suffocate on its own breath. The tree under my window commits plagiarism for the twentieth year in a row, green leaves upon green leaves. This year's cherry blossoms are not different from those when the cherry tree began, the same perfume permeates the air. And - although the old declare it tiresome - my sister kisses under trees as I did; she kisses passionately, forever plagiarizing her first kiss. I could as well recall grasses, all the grasses which have germinated from seed, faithfully and without compromise, like those of several months ago. Life giving birth does not fear plagiarism, just as death - stubborn in its repetition - always stupefies. Why then censure love poems, why object to their lack of shame and primitive disorderly groan of rapture repeated perpetually for centuries oblivious of readership.

-H. Poswiatowska, trad. A. Nasilowska


Thursday, January 21, 2016

I want to write about you

I  want to write about you
With your name to prop the crooked fence
The frozen cherry tree
About your lips
To form curved stanzas
About your lashes to lie taht they are dark
I want
To weave my fingers through your hair
Find a nook in your throat
Where with a muffled whisper
The heart defies the lips
I want
To mix your name with stars
With blood
To be inside you
Not to be with you
To vanish
Like a raindrop soaked into night

- Halina Poswiatowska, trad. Anna Nasilowska

Tuesday, January 19, 2016

Taming words

taming words
is harder
than taming tigers
surprised by their own swiftness
they pass through grasses
crawl cat-like up the trees
move their lips
close up
the smell of meat and feathers
sharp smell of blood
must all be loved
for the performance
to succeed


-Halina Poswiatowska, trad. Maya Peretz






oswajanie slów
jest trudniejsze
niz oswajanie tygrysów
one wlasna zwinnoscia zdumione
przeciagaja wsrod traw
wpelzaja kocio na drzewa
poruszaja wargami
z bliska
zapach miesa i pierza
ostry zapach krwi
trzeba pokochac je wszystkie
aby popis
wypadl pomyslnie

Monday, January 18, 2016

Sem título

II

Abstrato o Outono
como de folhas caídas
inteiramente feito.
De vôo indefinido
faço a ave que sonho
e no céu a lanço
cinzenta de espanto.
Olho e não sei:
vejo-me nua na nuvem
que ora passa.
Lento ponteiro que sofre
a prisão da sua marcha.


-Manuela Margarida

Sunday, January 17, 2016

Sem título

VI

Adormecem as aves da tarde
e as acácias, como eu,
aguardam o instante das coisas.

-Valdemar Valentino Velhinho Rodrigues

Saturday, January 16, 2016

After Auschwitz

Anger, 
as black as a hook, 
overtakes me. 
Each day, 
each Nazi
took, at 8: 00 A.M., a baby
and sauteed him for breakfast
in his frying pan. 

And death looks on with a casual eye
and picks at the dirt under his fingernail. 

Man is evil, 
I say aloud.
Man is a flower
that should be burnt, 
I say aloud.
Man
is a bird full of mud, 
I say aloud. 

And death looks on with a casual eye
and scratches his anus. 

Man with his small pink toes, 
with his miraculous fingers
is not a temple
but an outhouse, 
I say aloud.
Let man never again raise his teacup.
Let man never again write a book.
Let man never again put on his shoe.
Let man never again raise his eyes, 
on a soft July night.
Never. Never. Never. Never. Never.
I say those things aloud. 

I beg the Lord not to hear. 



-Anne Sexton 

Friday, January 15, 2016

When man enters woman

When man
enters woman,
like the surf biting the shore,
again and again,
and the woman opens her mouth in pleasure
and her teeth gleam
like the alphabet,
Logos appears milking a star,
and the man
inside of woman
ties a knot
so that they will
never again be separate
and the woman
climbs into a flower
and swallows its stem
and Logos appears
and unleashes their rivers

This man,
this woman
with their double hunger,
have tried to reach through
the curtain of God
and briefly they have,
though God
in his perversity
unties the knot.

-Anne Sexton




Quando homem
entra em mulher
como a espuma que morde a orla
de novo. De novo.
E a mulher abre sua boca no prazer
e seus dentes brilham
como um alfabeto,
o Logos surge ordenhando uma estrela
e o homem
mulher adentro
nó amarra
para que nunca
mais se separem
e a mulher
na flor sobe
lhe engole o estame
e o Logos surge
faz jorrar deles os rios

Esse homem
essa mulher
com sua fome bífida
tentaram alcançar
além da cortina, até Deus
e conseguiram. Por pouco
tempo, mas Deus,
Perverso,
desfaz o nó.


Ditador!

Sobre a tua cabeça
Disparo
A lei desfeita
Em pedaços
E dos pedaços
Desses pedaços
Sai a sorte
Que te destino!


- David Hopffer C. Almada

Wednesday, January 13, 2016

Variações sobre a caveira - II

Cabeça sem face
    e sem cabelos
uma grande certeza

Segurança contra o vento
contra o riso
contra a lâmina

cabeça sem carne
não teme o beijo

Órbitas sem olhos
maxilares sem dentes
nem fome nem alegria
não têm onde depositar
seus vermes

Invulnerabilidade

Por que então nossas cabeças
involucradas em pele que se contorce
com penteados implantados

Estar dentro da caveira
brilhante sob o sol
Passear pelas ruas
Esbofetear
quebrar a vitrine de todas as mentiras
arrancar os cabelos de todas as verdades

inviolável
iria até o bosque
na margem do rio
borboletas esvoaçantes
através de meus olhos
folhas crescentes
em vez de orelhas

Se permitir

Quando minha cabeça 
tornar-se caveira
não há demônio
que possa subjugá-la

Caveira 
sabre da natureza
balsa única sobre o rio negro.


-Miodrag Pávlovich (traduzido por Aleksandar Jovanovic)

Tuesday, January 12, 2016

Beau oui comme Bowie

OK, não é muito bom...



Mâle au féminin 
Légèrement fêlé 
Un peu trop félin 
Tu sais que tu es 

Beau oui comme Bowie (x4) 

Un peu d'Oscar Wilde 
Un peu Dorian Gray 
Quelques lueurs froides 
Et un air glacé 

Beau oui comme Bowie (x4) 

Entre le physique 
Et le figuré 
C'est comme la musique 
Suffit de balancer 

Beau oui comme Bowie (x4) 

Tout ce que tu as 
C'est tout ce que je hais 
Bien trop sûr de toi 
Tu sais que tu es 

Beau oui comme Bowie (x4)


- Isabelle Adjani (sim, a própria) 

Monday, January 11, 2016

Heroes

I, I will be king

And you, you will be queen
Though nothing will drive them away
We can beat them, just for one day
We can be Heroes, just for one day

And you, you can be mean
And I, I'll drink all the time
'Cause we're lovers, and that is a fact
Yes we're lovers, and that is that

Though nothing, will keep us together
We could steal time, 
just for one day
We can be Heroes, for ever and ever
What d'you say?

I, I wish you could swim
Like the dolphins, like dolphins can swim
Though nothing,
nothing will keep us together
We can beat them, for ever and ever
Oh we can be Heroes, 
just for one day

I, I will be king
And you, you will be queen
Though nothing will drive them away
We can be Heroes, just for one day
We can be us, just for one day

I, I can remember (I remember)
Standing, by the wall (by the wall)
And the guns shot above our heads
(over our heads)
And we kissed, 
as though nothing could fall
(nothing could fall)
And the shame was on the other side
Oh we can beat them, for ever and ever
Then we could be Heroes, 
just for one day

We can be Heroes
We can be Heroes
We can be Heroes
Just for one day
We can be Heroes

We're nothing, and nothing will help us
Maybe we're lying, 
then you better not stay
But we could be safer, 
just for one day

Oh-oh-oh-ohh, oh-oh-oh-ohh, 
just for one day

-David Bowie, aka Ziggy Stardust, aka Alladin Sane, Maj. Tom, his Grace the Thin White Duke, his Majesty the Goblin King. Requiescat in pace.


Friday, January 08, 2016

Metamorfoses III

Nós que retomamos da guerra podemos proclamar:
nossa treva é aquela escruidão transparente do bosque
em que matam os heróis pelas costas, junto à fonte,
nossas sombras são cobertores sangrentos
sobre o leito da mundana.
sombra sob o alpendre do palato da serpente,
que a sabedoria de outrora transforma em veneno,
a escuridão de órbitas feridas
que procuram violar a própria irmã
enquanto amaldiçoam a mãe,
sim nossas mucosas todas coladas,
e entre nós tudo o que nasceu para cantar
geme, ameaça e range
como dentadura em pesadelo.
No cálice de nossas cabeças aninhou-se a semente da
afronta e uma tribo inteira de insetos escuros,
conhecidos dos profetas,
e até a rubra cegueira do inferno é uma espécie de luz
sobre o negro pão de nosso negrume congênito.

E mandaram a santa iluminação
para uma raça destas,
ou para que nos ventile e ilumine
ou para que cegue mais ainda a luxúria com a própria mãe,
para desespero mais profundo e mais cruel.


-Miodrag Pávlovitch (trad. Aleksandar Jovanovic)

Tuesday, January 05, 2016

Second fig


Safe upon the solid rock the ugly houses stand: Come and see my shining palace built upon the sand!


- Edna St. Vincent Millay

Monday, January 04, 2016

Bêbados e putas


Все мы бражники здесь, блудницы,
Как невесело вместе нам!
На стенах цветы и птицы
Томятся по облакам.

Ты куришь черную трубку,
Так странен дымок над ней.
Я надела узкую юбку,
Чтоб казаться еще стройней.

Навсегда забиты окошки:
Что там, изморозь или гроза?
На глаза осторожной кошки
Похожи твои глаза.

О, как сердце мое тоскует!
Не смертного ль часа жду?
А та, что сейчас танцует,
Непременно будет в аду.

- Anna Akhmatova








Nós cá somos todos bêbados, putas,
E juntos, tão infelizes!
Nas paredes há pássaros e flores
que definham nas nuvens.

Você, com esse cachimbo de ébano,
esquisito de fumaças. 
Eu, com minha saia justa
(pra mostrar que sou magrinha).

As janelas estão todas tapadas
(Lá fora há gelo, há chuva..?)
Os olhos de gatos, ariscos
Parecem até com os teus.

Ah, expectativa que me mata!
Pela Hora esperamos todos?
Aquela, ali dançando...
vai pro inferno com certeza.







We're all drunkards here, and harlots:
how wretched we are together!
On the walls, flowers and birds
wait for the clouds to gather.

You puff on your burnished pipe,
strange shapes above you swim.
I have put on a narrow skirt
to show my lines are trim.

The windows are tightly sealed.
What brews? Thunder or sleet?
How well I know your look,
your eyes like a cautious cat.

O heavy heart, how long 
before the tolling bell?
But that one dancing there
will surely rot in hell!

- Translated by Stanley Kunitz